Como escolher um barco para construir?

Essa é uma dúvida que atormenta muitos construtores de barcos. Dúvida que pode durar anos. Ja até publicamos um artigo sobre a "falsa dúvida de qual barco construir". Muitas vezes a dúvida é um pretexto para não construir. Outras vezes falta espírito empreendedor. Também publicamos um artigo sobre a "superação psicológica para construir barcos".

Os barcos a vela são o sonho da maioria dos construtores, mas barcos a motor também podem ser uma alternativa interessante.
Surf Scoter 22 de Sam Devlin

Algumas dúvidas podemos eliminar logo de cara.

1) Que material devo usar? Madeira, fibra de vidro, espuma, ou aço?
Construa de madeira (compensado naval revestido de epoxi e fibra de vidro). Este material é consensual entre todos os projetistas internacionais. Barco de aço só vale a pena para grandes projetos, ou seja, são barcos caros, e a manutenção do aço requer alguma constância. Barcos 100% fibra só valem a pena para produção em série, porque requerem um molde que é tão complicado de fazer quanto o próprio barco. Espuma só vale a pena para barcos de alta performance (caros) e a construção é complicada, exige laminação por dentro e por fora com fibra de vidro (barco de madeira em geral só lamina por fora, deixando uma bela madeira aparente por dentro). Observando os sites de projetos vemos como os barcos de madeira e epoxi dominam o mercado de construção amadora, garantindo facilidade técnica, beleza e longevidade.

Multichine 28 não sai por menos de US$ 50 mil (Design R Barros)
2) Ok, barco de madeira: strip plank, plank on frame, stich and glue ou multichine?
O plank on frame é muito comum (placa sobre estrutura), é feita uma estrutura de madeira e as chapas de compensado naval são coladas na estrutura. Os multichines em geral são plank on frame. Também existem muitos projetos singlechine deste método. O stich and glue é muito prático, os costados e fundo são recortados no formato do projeto e são costurados e colados com epoxi, ja definindo o formato do casco, os reforços são adicionados à casca, o mobiliário faz parte da estrutura.
O strip plank permite cascos redondos, é um método antigo, e demanda a fresa de perfis estreitos de madeira que são colados um sobre os outros acompanhando as anteparas. Requer que seja enfibrado por fora e por dentro. Os projetos de cascos totalmente redondos para barcos a vela estão sendo substituídos por modelos mais modernos, mais planantes, multichine ou single chine.

3) Barco a motor ou vela?
Cada dúvida poderia gerar um livro, e esta dúvida é uma delas. Vela é um esporte, barco a motor nem sempre. Dizem que o barco a motor te leva a algum lugar, enquanto no barco a vela você ja está onde quer estar. Um barco a vela pequeno é mais barato do que um barco a motor pequeno. Na faixa dos 25 pés, um barco a vela pode ser mais caro do que um barco a motor, porque velas, mastros e catracas custam caro e o barco a vela também precisa de motor. Um barco deslocante a motor, tipo uma traineira, pode ser muito barato de construir, porque a motorização é pequena. O custo varia muito de acordo com o projeto. Alguns navegantes ja chegaram a conclusão que o barco a motor é mais prático e barato para travessias, mesmo com o consumo maior de diesel. Outros curtem o esporte da travessia sem motor, só na vela. Tudo é uma questão de gosto pessoal e interesses. Os houseboats por exemplo, são barcos a motor, muito bons para morar a bordo. Pequenos barcos a vela podem trazer muita alegria e uma boa cultura náutica.

4) Onde você vai guardar o barco depois de pronto?
Entramos no terreno do "boat ownership" ou propriedade de barco. Manter o barco custa mensalidade em marina. Quanto custa a marina onde você vai deixar o barco? Pretende rebocar e guardar em casa? Qual o tamanho do barco? Qual o tamanho do seu carro? O reboque constante em longas distâncias não é prático e tem riscos. Barcos grandes custam mais de R$ 1000 por mês em marinas de Parati. Tempos atrás um barco de 5 metros custava em torno de R$ 200 para manter em marinas de Itanhaém. Barcos pequenos podem ir no teto do carro. Os custos de manutenção do barco também precisam ser observados. Barco a motor convém usar regularmente porque a manutenção de motor parado pode ser cara.

5) Quantas pessoas você quer colocar a bordo?
Naut 575 para 4 pessoas dormirem (design JérômeDelaunay)
Existem projetos para uma pessoa, e outros para dezenas de pessoas. Eu pessoalmente só me interesso por projetos para duas pessoas, ou mais, assim posso sempre levar a esposa, ou um amigo. Se sua família tem 5 pessoas convém pensar em como equacionar o programa. As vezes dois barquinhos pequenos podem render animadas regatas e todos se divertem, ou então algo um pouco maior. Leve sempre em consideração os custos.

6) Qual seu orçamento?
Calcule bem sua disponibilidade mensal de caixa para ir investindo numa construção. Lembre-se que motores costumam ser mais caros do que cascos. Faz parte da construção fazer este planejamento, monte uma planilha com os custos. Faça a coisa certa. Não corra o risco do projeto inacabado.

Frota de Oz Gooose (design Michael Storer)
7) Barco grande ou pequeno?
Richard Woods escreve "monte o menor barco com o qual você ficaria feliz". Melhor um barco na mão daqui a dois meses do que um barco grande nem daqui a 10 anos. O barco pequeno é uma boa escola para barcos maiores. Todos sonham com barcos grandes, mas os pequenos tem muito valor. Um barco pequeno pode ser a diferença entre o tudo e o nada.

8) Qual o projetista? Devo buscar um projeto grátis?
Não busque projetos grátis. O projeto custa muito pouco perto do custo do barco e você tem inúmeras opções comprando os projetos. Na obsessão pelo projeto grátis o construtor fica a mercê de projetos limitados ou antiquados e sem suporte técnico e sem comunidade. Escolha um projetista reconhecido e faça parte de seu portfólio de construtores, assim você pode trocar idéias com outros colegas e valorizar seu barco como sendo de um designer famoso. Veja nosso artigo com sugestões de designers.

São mais ou menos essas as idéias. Sucesso e disciplina na obra!! Bons Ventos!!
Ricardo Ramalho